Como recomendado
por Hesíodo,
no quinto mês
cortei o lenho
para o leito
nupcial,
e ao arar a terra
as aves consultei.
Não sei o que
perguntaria ao
oráculo em Delfos,
mas a você pergunto
todos os dias
o que é o amor.
Aqui começam
provavelmente
a obscuridade
e a decepção.
Mas adoro as
partes sublinhadas
por você nos
livros de sua
biblioteca.
É como se
você adivinhasse
tudo o que eu
precisava
realmente
ler de
William James
e Eurípedes
muito antes
de me conhecer.
Ontem me detive
por alguns instantes
num metro quadrado
de calçada da rua
Senador Vergueiro
e, plano a plano,
turvação a turvação,
como se
em progressão
metafísica,
da Pura Existência
até a divina Ideia,
estivesse se
erguendo
dentro de mim
uma resposta iluminada,
um fluxo verbal
contínuo
homogêneo
e que afinal
não veio.
Paciência.
Veio, isso sim,
de um
maltrapilho
sentado no meio-fio
a pergunta:
“você sabe
onde eu moro?
sabe o meu nome?”
Quase só
olho para baixo;
mas os ouvidos
criam laços
com todas
as nuvens auditivas
ao redor,
venham de
onde vierem,
do trânsito,
das vozes,
dos cães de rua,
das rãs coaxando
nos buracos de
um jardim
ou do tremor
de todas as
palmeiras
súbito
desconectadas
do chão
sólido
do bairro
do Flamengo.
A vida dorme sob
quadrados de
papelão azul.
Não há outro
mundo onde o
céu seja menos
que raso.
O papelão
é de um azul
cunha a cunha
sem nuvens.
Toda casa
tem nuvens;
a rua brota esse
quadrado de
calçada,
ponto
de observação
do mundo,
tão propício
ou tão impróprio
quanto qualquer
outro.