Número 15

27 de Novembro de 2021

O LADO INCERTO

Taxistas versos Eu Paterson

ANA PAULA INÁCIO

Findo a semanal travessia em Campanhã
e Paterson – ainda não sei que o designarei assim –
abre-me a porta com eficácia
eu devolvo-lhe com agilidade o meu destino
de que ele desdenha porque as consoantes cortam
nada do leite e mel dos exemplos que me oferece
enquanto os meus olhos se vão abrindo
como pequenos bolbos d’espanto.

O meu Paterson – ainda não sei que o designarei assim –
atravessa uma cidade demasiado habitada
para lhe permitir uma clareira de melancolia
mas sabe que há palavras que são lâminas
ou clarões e par coeur um livro inteiro
que me pede para abrir com voz demasiado aguda
salva pelas farpas dos versos que esvaziam
os gestos falsos de famílias, políticos e amor
(o meu Paterson é um Mário-Henrique Leiria
embora não seja comido por esturjão)
e eu cumpro a promessa de o ouvir
até à última bandeirada que cai como no meu telemóvel
as promoções do Intermarché.

Ilustração de Diogo Bessa