Uma vez que tenhas experimentado voar,
Andarás pela terra com os olhos voltados para o céu
Pois lá estiveste e para lá desejas voltar.
Leonardo da Vinci
Como falar de paraquedismo com quem nunca voou?
O convite que me foi feito para escrever estas palavras coloca-me numa situação similar à de uma pessoa que quer ouvir um pássaro a cantar e para isso resolve dissecá-lo. Sabemos que no fim poderá conhecer um pouco melhor a anatomia do pássaro, mas ouvi-lo cantar…
Dito isto passemos à dissecação.
Tensão, vertigem, adrenalina e liberdade.
Tensão e espera dentro do avião, na subida.
Um sorriso, o saber que o momento chegou quando ouves: “a porta vai abrir”.
Vertigem no salto para o vazio, no impulso, na decisão de saltar.
O imenso choque de adrenalina na separação do avião.
Por fim o voo, a imensidão do espaço que nos cerca, a nossa pequenez, a força bruta dos elementos com os quais podemos aprender a dançar.
E a liberdade! Liberdade total. Sem pensamento. Só o presente está presente. A liberdade na plenitude do momento. Todo o nosso ser vibra, sem passado e sem futuro. Simplesmente estamos ali. E sabemos que estamos vivos, E sabemos o que isso é. E que é bom. Muito bom!
O Mundo
Em todas as práticas iniciáticas há uma passagem pela morte e um renascimento. O paraquedismo tem esta força, uma força ritual que ultrapassa o simbólico e é feito de carne e risco real. Este facto une. Não importa de onde vens, o que fazes, a tua idade, a tua cor. Tu saltas e como tal, obviamente, eu reconheço-te como igual, como irmão.
Neste mundo onde as cartas foram baralhadas e dadas de novo tens a teu lado polícias, actores, empregados de hotelaria, pilotos da TAP, reformados, estudantes, todos unidos por um único propósito: Saltar!
Paraquedismo e Teatro
São aparentemente dois mundos que nada têm em comum.
Erro.
Tal como o actor sabe que não pode parar um espectáculo e voltar ao início porque a apresentação lhe está a correr mal também o paraquedista sabe que não pode interromper o salto a meio.
The show must go on!

