“A última visão dos heróis” é uma série de 1995 que conjuga texto e imagem. Cada fotografia é dedicada a um herói e representa aquilo que poderia ter sido a sua última visão antes de morrer, evocando esse momento último em que o herói se confronta com o fim de uma vida dedicada a uma causa ou ao constante desafio dos próprios limites e a morte eminente em consequência dessa escolha. Momento em que se condensam todas as emoções, todas as memórias, em que a determinação tem uma derradeira prova e os gestos de cobardia ou de heroísmo se tornam igualmente inúteis. Imagens que se oferecem à contemplação do espectador, para serem confrontadas com a memória do herói que cada um tem, com os seus próprios fantasmas perante a morte do outro e a emoção de transcendência pressentida ou da eminência do nada.
Os heróis incluídos na série são: Humberto Delgado, Militão Ribeiro, José Dias Coelho, Chico Mendes, Amílcar Cabral, Steve Biko, Nicolau Lobato, Marsinah, Homa Darabi e Bobby Sands.
Na fotografia está inserido um pequeno texto com o título da série, o nome do herói, os anos de nascimento e morte, a actividade em que se notabilizou, o local, a data e as condições da morte. Este texto permite recontextualizar a imagem.
Perante esta série Jean Claude Lemagny comentou que a última imagem é provavelmente a única fotografia da vida, o resto é um filme.
Na fotografia que recria a última visão de Bobby Sands (1954-1981) está inserido o texto:
“Bobby Sands, como outros jovens irlandeses, começou desde cedo a testemunhar os actos de intimidação, pilhagem e assassinato perpretados pelos “specials”, os soldados das tropas britânicas de ocupação da Irlanda.
Aos 18 anos, alistou-se nos “Provos”, os guerrilheiros do Exército Republicano Irlandês (IRA). Começou então a ser perseguido pela Polícia. No Outono de 1972, com dezanove anos, foi preso pela primeira vez, tendo sido libertado quatro anos depois. Regressou novamente à luta numa unidade do IRA. Após seis meses de liberdade, quando a mulher esperava o primeiro filho, foi preso de novo e condenado a quinze anos.
Na prisão iniciou o “protesto do cobertor”, que consistia na recusa em usar farda e a fazer trabalho prisional, reivindicando o estatuto de prisioneiro político. Ficou assim encerrado numa cela vazia, nú, enrolado num cobertor e sem qualquer comunicação com o meio exterior, sendo sujeito com frequência a interrogatórios e torturas.
A 20 de Março de 1978 iniciou uma greve de limpeza, em conjunto com outros prisioneiros dos Blocos H da prisão de Long Kesh, recusando-se a lavar e a limpar a cela, onde se começaram a acumular o lixo e excrementos. Assim se manteve três anos.
Como a reivindicação não tivesse sido aceite iniciou uma greve de fome em 1 de Março de 1981. Durante este período Bobby Sands foi eleito Deputado para a Câmara dos Comuns ao Parlamento Britânico. Apesar dos apelos internacionais, Margaret Thatcher manteve a recusa do reconhecimento do estatuto de prisioneiro político.
Às 11 horas e 17 minutos do dia 4 de Maio de 1981, Bobby Sands morreu, após 66 dias de greve da fome. Tinha 27 anos . Foi o primeiro dos dez nacionalistas que por essa altura morreram em greve da fome”.