Número 19

5 de Fevereiro de 2022

CAIXA ALTA

Isabel Craveiro: “No teatro nunca estamos sozinhos”

ANDREIA M. SILVA

Num tempo tão povoado de sombra e distâncias, o teatro ainda é lugar de salvação. Porque em palco, como diz Isabel Craveiro, nada se faz sozinho, nunca se está sozinho. A arte continua a ser um ato de resistência com tudo o que a resistência envolve: entrega, medo, coragem.

Nascida na Covilhã, Isabel Craveiro iniciou a sua formação teatral no Teatro dos Estudantes da Universidade de Coimbra (TEUC) e, posteriormente, no projeto da Licenciatura em Teatro e Educação da Escola Superior de Educação de Coimbra (ESEC), com coordenação de Manuel Guerra e António Mercado.

É atriz, encenadora e diretora artística do Teatrão onde, a par da criação e programação da Oficina Municipal do Teatro, coordena a atividade pedagógica e o trabalho com a comunidade. A companhia carrega no seu ADN essa inquietude, essa vontade grande de chegar às pessoas e se deixar espantar com elas.

— O Teatrão começou por ser uma companhia de teatro para a infância. Como era o contexto cultural há duas décadas?

— Era bastante diferente, claro. Sabemos todos que a atividade cultural em Portugal é alicerçada em falta de financiamento e de estratégia, o mesmo será dizer que nunca houve uma política do Estado para a cultura, que organizasse, dignificasse e articulasse este setor. Mas há 20 anos ainda existiam menos financiamentos, menos espaços, menos estruturas de criação. No caso do Teatrão, existia uma estrutura de produção mínima, atores e restante equipa contratados por produção (dois por ano). E mais nada. 

— Quando – e porquê – decidiu o Teatrão decidiu alargar a sua ação a um público mais heterogéneo?

— Foi uma evolução gradual. Começámos a trabalhar com público adolescente, a estruturar o serviço pedagógico e a trabalhar com outras idades. Mas a matriz fundadora, de uma estrutura profundamente dedicada a relação com a formação artística, a mediação de públicos, a intervenção na comunidade, que permita que o teatro esteja presente para todos os que vivem nesta cidade, no centro ou na periferia, novos ou velhos, ricos ou pobres, com um trabalho de muita qualidade, essa matriz é intocável.

— Ao longo dos anos, têm sido uma companhia profissional que procura estreitar os laços com a comunidade através da produção teatral e artística. Como tem sido essa experiência?

— Muito rica. Temos experimentado muitas formas que decorrem da especificidade dos projetos. Temos trabalhado com muitas pessoas e estruturas. O nosso foco é sempre o trabalho da dramaturgia, da encenação e interpretação. Esta tríade é o coração do nosso trabalho, claro que acompanhada pelas outras áreas, desde a música ao trabalho cenografia ou de figurinos. No palco ou na rua, o que nos mobiliza sempre em primeiro lugar é a discussão com o público sobre o mundo em que vivemos. A grande maioria das vezes desenhamos atividades para além dos espetáculos, que permitem ampliar e aprofundar determinadas discussões, experimentar outras relações com o público, testar a resposta das pessoas a outros desafios. Regra geral, divertimo-nos muito e espantamo-nos muito com as pessoas.

— Como é que companhia viveu os períodos de confinamento? Como foi possível pensar a vossa atividade sem o público?

— Foi difícil. No primeiro ficamos mesmo atordoados. No segundo estivemos em lay-off parcial, preparando uma nova produção. Foi mais fácil, apoiamo-nos muito. Antes de voltar a abrir o teatro tivemos necessidade de falar com o público, de saber se voltariam, se conseguiam cumprir as regras, se estavam dispostos a isso. Foi muito bonito. Nunca tivemos problemas com as regras, acho que voltámos todos do confinamento a valorizar muito mais as atividades de lazer e também a forma como nos relacionamos com a produção cultural.

— Em que ano entrou para o Teatrão? Como foi o seu percurso até esse momento?

— Entrei em 2001. Foi um percurso muito feliz porque considero que tive espaço para fazer e experimentar muito e em muitas áreas, da produção à interpretação, da encenação à docência. Muitos momentos difíceis, mas muita sorte em ser sempre acompanhada por muita gente incrível. No teatro não fazemos nada nem estamos nunca sozinhos. Somos um coletivo, queremos ser, apesar do trabalho que dá, um coletivo.

— Nasceu na Covilhã em 1973. Escolheu Coimbra para estudar e trabalhar. Como nasceu esse apelo para o teatro?

— Como muita gente em Coimbra, a minha prática teatral começou no teatro universitário. No meu caso, no Teatro dos Estudantes da Universidade de Coimbra, TEUC.

– O que representa, na sua vida, o teatro?

A minha profissão, aquilo que me dá prazer, que me desafia, dá medo e me estimula. 



Isabel Craveiro, fotografia de Carlos Gomes