A nota desta semana traz-nos um primeiro olhar sobre as experiências de Slavick no domínio da fotografia aplicada à botânica. Se desde o início da fotografia, sobretudo em Inglaterra, esta ligação era óbvia (1), na verdade a utilização da fotografia no estudo das formas botânicas, ainda que não inexistente, ficou um pouco esquecido (2). Neste caso não se trata de uma mera fotografia ilustrativa (uma constante que atravessa a sua obra), mas de uma tentativa de ir um pouco mais além aliando técnica e representação através da utilização de técnicas que se confundem com o próprio objeto fotografado.
Na casa da rua Říční, para além do atelier de impressão de gravura que Slavick tinha montado num anexo do jardim traseiro, tem igualmente uma estufa onde dá largas à sua paixão pela botânica tentando criar algumas espécies exóticas que não faziam parte do universo vegetal quer do lugar, quer da época. Era um visitante regular dos Kew Gardens, em Londres e do Real Jardín Botánico de Madrid, entre outros e acompanhou a mudança do Botanischer Garten de Berlim para o local onde se encontra atualmente. De todos eles trazia sementes e espécimes para plantar e estudar. Para além da botânica, enquanto disciplina, o jardim, num sentido mais lato, era um dos seus tópicos de estudo o que se pode atestar pelas inúmeras reflexões anotadas nos seus cadernos e na extensa coleção de imagens que se encontram no seu espólio, sendo que a maioria até nem são da sua autoria. No caso de alguns jardins, para além das suas, recolhe fotografias de outros autores, gravuras, alguns desenhos, poucos, reproduções de pinturas (3) e até plantas, quando existem, numa tentativa de entender o raciocínio que esteve na base da sua conceção (4).
Nas viagens a Inglaterra, entra em contacto com as técnicas da Antotipia (5) e vai utilizar plantas produzidas na sua estufa para criar as emulsões que utiliza na reprodução de vários elementos vegetais. Na sua maioria são folhas de plantas secas, que imprime por contacto e tem alguns exemplares, como é o caso presente, impressos a partir de negativos da sua autoria. A estabilidade das imagens produzidas por estas técnicas é baixa, pelo que a maioria dos exemplares estão em péssimas condições de conservação. Neste caso temos um belo exemplar de uma folha de uma Monstera deliciosa, criada na sua estufa e impressa com recurso a plantas que teriam um forte cromatismo arroxeado que acabou por se desvanecer ao longo do tempo. Contudo, Slavick previu esta degradação e isso era uma das coisas que lhe agradava nesta técnica. Para impressões permanentes, conhecia bem as técnicas a utilizar e que utilizava com rigor, sobretudo em trabalhos para terceiros, como as impressões a carvão e as viragens a platina. Neste caso, a degradação ao longo do tempo, previsão que ele anota no seu caderno como uma quase e mais que certa fatalidade, tendo em conta a própria matéria orgânica da emulsão é, sem dúvida, o que lhe satisfazia mais na sua ideia de relacionar a representação com o representado. No fundo, imagem e objeto eram fundamentalmente feitos da mesma matéria e a degradação de ambos decorreria em paralelo cada uma com as suas características intrínsecas, mas obedecendo às mesmas leis da natureza.
(1) Ver Photographs of British Algae: Cyanotype Impressions, de Anna Atkins, ou as primeiras experiências de William Henry Fox-Talbot com os fotogramas em que utiliza espécies botânicas.
(2) Ver Fieschi, Caroline; Photographier les plantes au XIXe siècle. La photographie dans les livres de botanique, Paris; Éditions du Comité des travaux historiques et scientifiques; 2008
(3) Quando visitou a Villa Medici, escreve que foi à procura do canto que Velásquez representou na pequena pintura que está no Prado (Velázquez, Diego; Vista del jardín de la Villa Medici en Roma, 1630, número de inventário P001210) e que tanto o impressionou [SLA/LS/MISC/N73]
(4) Refere-se sobretudo aos jardins franceses, chegando a comparar o rigor do seu desenho ao rigor das fotografias de Atget, quando o conheceu em Paris. Este assunto, dos jardins, regressaremos noutras notas.
(5) A Antotipia é uma técnica fotográfica que utiliza extratos de matéria vegetal como emulsão sensível à luz, o que permite a impressão por contacto quer de negativos, quer de objetos à semelhança dos fotogramas. A impressão de negativos é delicada uma vez que as exposições são demasiado longas com tendência a desvanecer o cromatismo.