Espectáculo teatral estreado a 27 de Dezembro de 2001, no Teatro do Inatel, Coimbra
Textos: Adília Lopes, Jamie Pachino, José Geraldo, José Moreno Arenas, Michael T. Folie, Michelle Wild e Wislawa Szymborska / Interpretação : Helena Faria e Alexandra Silva / Dramaturgia e encenação: José Geraldo / Direcção técnica: Afonso Pereira Francisco / Fotografia: Fernanda Vieira
Ridiculum Vitae foi o segundo espectáculo teatral da Camaleão, tendo sido o primeiro para um público adulto. Das memórias que restam, aqui se deixam duas fotografias e dois pequenos textos — um excerto de “Colababy!” de Michael T. Folie, e o poema “Curriculum Vitae” de Wislawa Szymborska — para revisitar, vinte anos volvidos, o ambiente dramático do espectáculo.
“Chamo-me Olívia Oliveira e sou uma das Coordenadoras dos Programas Especiais da Tasta-Cola Bottling Company. Certamente já repararam nas Tasta-Cola soft drinks grátis que nós vos fornecemos durante os intervalos.
Esta noite, porém, eu não estou aqui para oferecer refrigerantes, estou aqui para vos oferecer dinheiro. É verdade. A Tasta-Cola Bottling Company gostaria de dar a cada casal de futuros pais esta noite aqui presentes… 500 euros. Aposto que uns 500 euros extra vinham agora mesmo a calhar, então não vinham?
Eu sei. Vocês estão aí a pensar, “qual é o truque, Olívia?” O truque é que vocês e os vossos filhos que estão por nascer podem ter um papel importante no mais excitante programa de marketing de um produto de consumo em toda a história.
As grávidas que concordem em participar e assinem o nosso contrato receberão uma injecção muito muito pequenina antes do parto, administrada por um médico ou uma enfermeira totalmente credenciada. E é tudo o que se tem de fazer. […]”
Colababy!, de Michael T. Folie
CURRICULUM VITAE
Wislawa Szymborska
O que é então necessário?
Preencher um requerimento
e juntar um Curriculum Vitae.
Seja curta ou longa a vida,
o curriculum deve ser breve,
conciso, selectivo e rigoroso.
Transforma as paisagens em moradas
e as recordações vagas em datas fixas.
De todos os amores, nomeia só o conjugal,
e dos filhos, só os que nasceram realmente.
É mais importante quem te conhece, do que quem tu conheces.
Em relação às viagens, só as que fizeste ao estrangeiro.
Que és membro de quê, mas sem justificar porquê.
Quais prémios e distinções, mas sem explicar os motivos.
Escreve como se nunca tivesses falado contigo próprio,
guardando distância de ti mesmo.
Passa em silêncio cães, gatos e pássaros,
memórias de pacotilha, amigos e sonhos.
Menciona o preço, não o valor,
refere o título, não o conteúdo.
O número que calças é mais precioso
do que o sítio para onde se dirige a pessoa que eles supõem que tu és.
Junta também uma fotografia, tipo passe, com uma orelha bem visível.
É a sua forma que conta, não o que ela escuta.
E o que é que ela escuta?
O roncar das máquinas que trituram as folhas de papel.