«Felizmente o avô está ali ao pé e baixinho vai-lhe passando alguns [pecados] emprestados.»
«AS RACHAS», O LIVRO DAS IGREJAS ABANDONADAS,
Tonino Guerra,
Trad. José Colaço Barreiros, Assírio & Alvim, 1997
Se quiseres empresto-te os meus pecados
para exibires aos fins-de-semana
encostas o teu fato de virtude em frente a casa
como um carro bem estacionado
e sais para os bares de sábado
passeando-os como bestas amansadas
galinhas ou furões.
Podes também levá-los à missa
para experimentares a ira de Deus
ou o seu perdão
reuni-los em almoço de família
e ninguém quererá a tua tosquia
para tricotar carapins ou outros materiais de sono.
Mas firmaremos um pacto
terás de mos devolver antes que segunda comece
gosto deles para iniciar a semana
penteá-los eriçar-lhes o pêlo
gosto deles para que me ensinem a errância
e a sua inútil utilidade
embora não deseje que m’inspirem epitáfio
prefiro cinzas a lápides
cair em solo de jardim esquecido
onde os frutos sejam crimes
debicados pelos pássaros